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Drazen: A lenda silenciosa




Quando alguém deixa este planeta de forma trágica, nos perguntamos o porquê destas coisas acontecerem. Questionamos o vazio que nos fere o coração, insultamos as divindades e o destino, choramos sem compreender o motivo de nos ser tirado algo tão precioso. Jamais aceitamos que as coisas talvez sejam como devem ser: sem roteiro, sem linhas retas. Na curta vida de Drazen Petrovic, a dor de sua ausência e o choque de sua partida foram proporcionais ao legado que deixou.

Os anos 1980 e 1990 foram particularmente tensos na europa, sobretudo na região dos Bálcãs. Em meio à guerra civil, segregação étnica e conflitos entre irmãos de um mesmo pais, Petrovic foi um dos poucos motivos de alegria para uma nação sofrida e maltratada pelos governantes. Um gênio que , em uma era sem a internet como a conhecemos hoje, assombrou a Europa e a NBA com sua classe ímpar e uma mágica quase inigualável no esporte. Para relatar seu caminho de glória e polêmicas, é preciso retornar até 1964.

Nascido em Sibenik, antiga Iugoslávia, Drazen se apaixonou de imediato pelo baaquete, influenciado pelo irmão mais velho, Aleksandar, atual técnico da Seleção Brasileira de Basquete. Treinava em uma quadra do bairro e, segundo sua mãe, ficava horas arremessando e melhorando seu jogo. Aos 15 anos, já integrava os profissionais do Sibenik, obtendo dois vices nacionais em dois anos. Após um ano no exército, foi para o gigante Cibona Zagreb, e já em seu primeiro ano conseguiu a dobradinha Copa e Campeonato.

Talvez você não saiba, mas em 1985, Petro teve uma das maiores atuações da história do esporte: marcou incríveis 112 pontos (!!!), acertando 40/60 arremessos.  Nos 4 anos de clube, manteve absurdos 37.7 pontos por jogo. Aos 19 anos, já comandava a Iugoslávia em sua primeira olimpíada, em Los Angeles, conquistando o Bronze, que viria mais duas vezes: em 86 no Mundial e no ano seguinte no Europeu. Nesta época, começou uma amizade com outro jovem e promissor atleta: Vlade Divac. Companheiro de quarto por muito tempo, seria personagem de um episódio triste que mudaria a vida de ambos para sempre anos mais tarde.

Seus talentos foram reconhecidos pela NBA e Drazen foi draftado em 1986 pelo Portland Trail Blazers, porém só iria para os EUA três anos depois. Passou a atuar pelo Real Madrid, talvez o maior clube europeu, onde conseguiu o bicampeonato da Copa dos Campeões. Na segunda decisão, seu maior momento: destruiu o Snaidero Caserta, da Itália, time de Oscar Schmidt, marcando 62 pontos, sendo eleito MVP do campeonato e do continente. 

Chegaram as olimpíadas de Seul e Petro novamente se destacou, levando a Iugoslávia ao vice, parando na forte URSS do mito Arvydas Sabonis.  Apesar do sucesso, Drazen estava triste. Desembarcou no Oregon, porém a concorrência com Terry Porter e Clyde Drexler fez seu jogo ser limitado. Suas frustrações e medos eram compartilhados por horas com o amigo Vlade, que já brilhava no Showtime dos Lakers de Magic Johnson. A convicção em seu talento era posta à prova.

Céu e inferno andaram lado a lado para Petro em 1990. Pouco atuando na NBA, partiu para o Mundial na Argentina com o amigo e ao lado de grandes nomes como Dino Radja, Toni Kukoc e Zarko Paspalj. Totalmente entrosados, o time iugoslavo arrebentou com os adversários e teve a revanche contra os soviéticos, conquistando o título mundial. Em meio a alegria e euforia, quis o destino que a relação entre os dois se encerrasse ali: um torcedor invadiu a quadra com a bandeira croata. Vlade, sérvio , a tirou da mão do nacionalista, em protesto. A imprensa croata alegou um suposto cuspe de Divac e o tornou vilão. Os países inflaram o ódio e o convivios entre ambos acabou completamente.

Finalmente, Petro teve seu pedido atendido pela diretoria dos Blazers. Em uma troca, foi enviado para New Jersey. Ao lado dos jovens Kenny Anderson e Derrick Coleman, devolveu o Nets aos playoffs pela primeira vez em seis anos. Em 1992, com  médias de 22,3 pontos e 3,6 assistências, foi eleito para o ALL NBA 3rd Team. A maior liga de basquete se rendia ao rapaz de poucas palavras e gênio indomável.

Assim como o esporte, a vida é cheia de incertezas. A guerra civil aflorava o pior do ser humano e a Iugoslávia se desmanchou em várias repúblicas. O medo de perder familiares era constante. Sendo assim, as olimpíadas de Barcelona, após sanções internacionais, trouxe a Croácia como país independente e a Sérvia foi proibida de participar. Após campanha impecável, Petrovic teve a chance de enfrentar o Dream Team. Sem dúvidas, uma tarefa hercúlea, que nem mesmo a genialidade do Mozart do Basquete foi capaz de alcançar. A prata era o ouro dos mortais.

Infelizmente, o ponto final deste livro chegou no dia 7 de Junho de 1993. Após a temporada da NBA terminar e sem necessidade de participar pela força da equipe, Petrovic  decidiu viajar até a Europa para jogar as eliminatórias do Mundial. No retorno para casa, preferiu deixar o vôo numa escala em Frankfurt  para esperar a namorada e fazer a viagem de carro para passar mais tempo junto de seu amor. Uma forte chuva, a falta do cinto de segurança e a inexperiência da garota ao volante puseram fim a vida de Petro num pára-choque de caminhão. Ele dormia no banco do carona. Não sofreu. Para quem fez tanto por um país, seria pouco justo ver seu final de aproximar. Apenas se foi. Melhor assim. 

Aos 28 anos e certamente com grande futuro na NBA, um gênio partia para a eternidade. 100 mil pessoas compareceram ao seu enterro. Em Los Angeles, Vlade Divac assistia perplexo ao noticiário. Não houve tempo para reconciliação. Coisas da vida.

Petro teve uma estátua feita em Sibenik para homenagear seu filho pródigo. Em New Jersey, sua camisa 3 está eternizada e aposentada, memória de grandes momentos onde até hoje muitos fãs se lembram do locutor do Izod Center gritando:

- Petro for 3, Got It !!!!!!!!!

E eu, longe de questionar a vida ou os deuses, apenas pergunto a eles:
Por que não o seguraram naquele vôo na Alemanha?

Créditos da imagem: site oficial da NBA - fotógrafo não destacado

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