O tango de uma nota só: Argentina de malas prontas
Na música existe um quesito fundamental que precisa estar perfeito: a harmonia. Independentemente do estilo musical ou dos músicos; a harmonia precisa existir. Se o guitarrista inicia uma canção em 'dó', apenas dará certo se o tecladista seguir a mesma escala, pois, se resolver soltar um 'Lá', acontecerá o que chamamos de 'poluição sonora'. Um verdadeiro horror! Assim enxergo a seleção da Argentina, algo extremamente fora de harmonia e sem a menor sintonia.
Se analisarmos as peças individuais da esquadra 'albiceleste', vamos encontrar um elenco recheado de estrelas internacionais. O goleiro Caballero é alguém bastante contestável, mas nem por isso deixa de ser jogador do poderoso Chelsea. A zaga conta com um dos homens de confiança de Pep Guardiola no Manchester City, Otamendi é muito bem visto no futebol europeu, no entanto, mais parece o 'Paulão do Vasco' no time de Sampaoli. Mascherano, que até ontem estava no Barcelona, se transferiu ao futebol chinês em janeiro. Kun Agüero; alguém dúvida que ele é um dos melhores atacantes do futebol mundial na atualidade? Dybala, Higuaín, Di Maria e outros promissores nomes que atuam no país. Sem contar Lionel Messi, que nessa Copa do Mundo parece estar com braços e pernas acorrentadas, um cenário bizarro.
O jogo de ontem contra a Croácia, pela segunda rodada do mundial da Rússia, foi um show de horrores protagonizado pela seleção argentina. Organização tática? Nunca nem vi! Meio campo criativo? Nem de longe! Um camisa '10' inspirado? Só se for no VT dos jogos do Barcelona. Messi estava irreconhecível. Jogador passivo ao péssimo jogo feito por sua equipe, parecia irritado, dava a impressão de ter entregado os pontos e, de fato, entregou.
Sem a inspiração de sua maior estrela, a Argentina simplesmente não se encontrou em campo. O gol de Rebíc aos 8 minutos do segundo tempo fez desandar definitivamente a 'maionese'. O goleirão Caballero mostrou toda a sua falta de habilidade no jogo com os pés, e presenteou o atacante croata com um passe açucarado que resultou em um golaço de rara felicidade. O segundo gol dos europeus já aconteceu em um momento onde a mínima organização necessária já não se encontrava na equipe de Messi; que viu Luka Modric acertar um chute maravilhoso aos 30 minutos, após um contra-ataque muito bem armado. Ivan Rakitic, aos 46', decretou o vexame dos nossos hermanos em um gol que mais parecia lance de treino. Aliás, não podemos esquecer de exaltar o desempenho do time comandado por Zlatko Dalic, que simplesmente não cometeu erros. Com um esquema de jogo muito bem definido, os croatas atacavam em bloco e defendiam da mesma forma, congestionando de maneira muito organizada todos os espaços que poderiam acarretar em contra-ataques perigosos. A Croacia engoliu os argentinos.
O que o mundo esperava era uma atuação acima da média de Lionel Messi, que já cansou de demonstrar ser capaz de faze-lo. Na partida contra a Islandia o craque do Barcelona estava até mais ligado; criou mais, finalizou mais e foi o responsável pelas principais jogadas de perigo do time. Mas ontem... pra ser sincero: Messi não entrou em campo. Muito aquém do que se espera dele e, essa expectativa é um peso que talvez 'la pulga' não possa carregar. Os anos sem titulo que o futebol argentino enfrenta, muito tem a ver com a falta de organização de sua federação. Troca de presidentes, troca de treinadores, greve dos clubes que disputam a liga argentina; uma sucessão de acontecimentos às vésperas de uma Copa do Mundo. Sampaoli não conseguiu implantar em tão pouco tempo o que ele pensa sobre futebol, uma filosofia de jogo ofensivo e seguro na marcação; um estilo que pode reconstruir o rompido futebol argentino. Mas, será que haverá continuidade se confirmando a eliminação hermana?
Assim como apenas "uma andorinha não faz verão", acredito que não há como tocar um tango com uma nota só. Messi pode até ter ficado muito abaixo das expectativas, mas é certamente muito difícil encaixar um jogo tão bem definido como tem o craque, em uma seleção que não consegue se encontrar. Por incrível que pareça, Messi é o só mais uma peça de um quebra-cabeças incompleto. Ainda não acabou, há mais uma chance. Hoje, Islândia e Nigéria fazem um jogo que é crucial para a sobrevivência 'albiceleste' na competição. Em caso de vitória islandesa, a eliminação se tornará quase uma realidade, levando em consideração o saldo de gols, que é de -3 no caso dos sul-americanos. Uma vitória da Nigéria deixaria o grupo bem aberto. Caso os africanos triunfem hoje, ficariam com 3 pontos na segunda colocação do grupo; com Croácia em primeiro, Islandia em terceiro e Argentina em último. Porém, na última rodada os hermanos precisariam vencer a Nigéria, e torcer que a Islandia não vença a Croácia - que entrará em campo classificada. No caso de um empate, a situação é a mesma. A única certeza é que só a vitória interessa ao time de Messi, que está muito perto de sentir o gosto de uma eliminação histórica.
O fracasso também faz parte da carreira dos mais brilhantes profissionais, não existe um motivo que seja minimamente plausível para creditarmos apenas a Lionel Messi o fracasso de toda uma geração. Claro, se esperava mais de um jogador que assombrou o mundo com jogadas simplesmente impressionantes nos últimos 12 anos. Essa era pra ser a Copa de Lionel Messi, e acabou se transformando no maior pesadelo da carreira do camisa '10' do Barça.
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