Um legado chamado "NFL Luluzinha Club"

Como alguém entra no estádio do Seattle Seahawks, no meio da torcida da casa e com a camisa do 49ers? Foi deste modo, que uma publicitária gaúcha radicada em São Paulo, resolveu se "aventurar" no universo do futebol americano e assim, passou a desafiar aqueles que diziam que "esse esporte é coisa pra homem".  A "aventura" se transformou em trabalho sério, consistente e reconhecido. Medo de preconceito? "(...) a gente não dá bola pra isso!"

O "NFL Luluzinha Club" foi fundado em 2013. Inicialmente, apenas com perfis nas principais redes sociais e, logo em seguida, com o blog. Aos poucos, o projeto foi crescendo, ganhando corpo, recebendo grande apoio, inclusive das emissoras que transmitiam a NFL no Brasil. Cinco anos depois, e tendo na bagagem participações em transmissões e programas da ESPN e outras mídias importantes, o site hoje é uma referência pra quem acompanha ou quer passar a acompanhar o futebol americano no Brasil. 

Conversamos com a idealizadora  do projeto, Etienne Du Jardim. A Big Boss das "Luluzinhas" nos contou tudo sobre como conheceu a NFL, o carinho e a amizade com as meninas que fazem - ou fizeram - parte do clube, e, claro, sobre os planos e objetivos para o futuro.  

Confira o nosso papo na íntegra: 

1 - Como você conheceu e por que se apaixonou pelo futebol americano?

Etienne Du Jardin

 Publicitária e Idealizadora do projeto

"Eu conheci a NFL super por acaso, eu não acompanhava esse esporte, na verdade eu nunca fui uma pessoa muito esportiva. Não acompanhava esporte nenhum, começava a me interessar, mas logo perdia esse interesse, nunca pratiquei esporte nenhum também. E comecei a namorar o Paulo, que hoje é meu marido. Ele gostava muito de futebol americano e muito de vários esportes. Mas ele acompanhava o futebol americano demais. Eu lembro que quando a gente começou a namorar, eu perdia ele TODOS os domingos, porque ele assistia a todos os jogos. E eu sempre ia fazer alguma outra coisa no domingo. Até que um dia, choveu muito aqui em São Paulo e eu fiquei em casa. Daí eu fui sentar com ele na sala, bem desinteressada. Ele falou assim pra mim: "sabe quem é que está jogando aí?" E eu falei que não sabia. Ele me disse: "é o marido da Gisele Bündchen". E eu falei, "Ah, é? O que ele faz?". Aí ele me disse, que era Quarterback e tal. E eu comecei a me interessar. Perguntando o que era isso, o que era aquilo... e todos os jogos que ele assistiu naquele dia eu fiquei do lado e enchendo ele de perguntas. Eu me interessei muito pelo esporte, porque ele explicou de uma maneira muito legal, focada na estratégia, na questão territorial, de ter que avançar no território do outro, que era um jogo que poderia mudar nos últimos segundos... e a gente pegou uns jogos muito bons naquele dia, com muitas voltas... Então, no outro dia, que era uma segunda-feira, tinha o MONDAY NIGHT, e eu sentei pra assistir por conta. E foi assim que a NFL  (futebol americano) apareceu na minha vida"

"Por que eu me apaixonei? Eu acho que eu me apaixonei pelo mesmo motivo que qualquer pessoa que conhece o esporte se apaixona, sabe!? Tem uma coisa que eu sempre digo desde quando eu comecei a gostar: o mundo é dividido entre dois tipos de pessoas: as que amam a NFL, amam o futebol americano, e as que não conhecem. É um esporte muito dinâmico, muito democrático, a questão da estratégia é muito legal. Então não tem um motivo especial de porquê eu gosto. Eu acho que eu gosto porque eu conheci, me abri pra conhecer esse esporte. Porque realmente ele é um esporte muito completo". 

2 - Que time torce na NFL? Desde quando acompanha?

"Eu tenho time sim, eu sou 49ers. E por uma questão até bem engraçada. Eu digo que eu não escolhi o time na NFL, ele me escolheu. Por quê? Quando eu comecei a acompanhar, eu sabia que eu tinha que escolher um time, né!? Muita gente ia assistir jogo na minha casa por conta do meu marido e todos eles falavam que eu tinha que escolher um time. Então tinha muita gente que era 49ers, era Giants, Broncos... ali (no meio) na galera. E eu falei: bom, já que eu vou escolher um time, vou pesquisar os times. E comecei a pesquisar, assistir os jogos e fui criando identificação com eles. E eu amo o Peyton Manning, amo demais, assim... e eu queria ser Broncos por causa dele - adorava o Von Muller também. E eu achava que eu ia ser Broncos, sabe!? Só que o quê acabava acontecendo? Eu via muitos jogos dos 49ers por causa do meu marido e os amigos dele. E quando eu me via, eu estava sofrendo pelo 49ers e não sofria pelo Broncos. O Broncos perdia, eu pensava "Ah, ok!". Mas quando o 49ers perdia eu ficava muito chateada, eu ficava P#$%... então eu digo que (o time) acabou me escolhendo. E na época foi... 2013 a temporada... o Kaepernick, ele estava jogando demais, sabe. Então, pessoalmente, ele era um jogador que eu curtia bastante, gostava muito dele. Então foi meio que isso. Eu me apaixonei pelo 49ers sem querer. Fiquei uma temporada e meia tentando escolher time depois que eu comecei a assistir, e o 49ers acabou me escolhendo, não consegui escolher ninguém. Tem outros times ali que eu tenho uma simpatia muito grande, que eu estou sempre acompanhando. Mas time do coração mesmo é o 49ers."

3 – Como surgiu a página/o NFL Luluzinha Club? Hoje, quantas “Luluzinhas” são?

"O Luluzinha surgiu pelo seguinte: quando eu comecei a me interessar pelo futebol americano, eu queria ler sobre ele. E na época, tudo o que eu encontrava de conteúdo era pra quem já acompanhava, ele não era pra iniciantes. Além do mais, os conteúdos, eles eram praticamente todos de fora. O que tinha em português, era muita coisa machista, que eu não gostava, não me sentia muito bem ali. E daí eu pensei: se estou começando a assistir o esporte, se eu estou gostando, preciso saber mais; devem ter mulheres na mesma situação, ou que já conhecem e podem me ajudar. Daí eu falei: eu vou criar o "Luluzinha Club". Eu sou "velha", né gente!? Então na minha época tinha essa coisa de clube da Luluzinha, clube do Bolinha... eu pensei, vamos criar o clube da Luluzinha pra começar a falar com outras mulheres e entender melhor o esporte. Então ele (Luluzinha Club) nasceu por isso."

3.1 - Quantas "Luluzinhas" são?

"Hoje nós somos vinte e cinco mulheres espalhadas pelo Brasil todo, temos (também) nossas correspondentes internacionais.  Já tivemos dentro do 'crew' trinta e cinco mulheres trabalhando. E a gente se divide por função. Cada uma tem uma função diferente - especial - dentro do site. E assim a gente consegue levar futebol americano pra todo mundo."  

4 – Qual a dificuldade que vocês sofreram/sofrem neste ambiente dos Esportes?

"A gente não sofreu muita dificuldade. Tivemos um apoio muito grande quando nasceu. A primeiras coisas que surgiram do Luluzinha foram as redes sociais e, logo em seguida, o blog. E dentro das redes sociais a gente recebeu muito apoio do pessoal da ESPN e do Esporte Interativo, logo que começou. Por ser justamente  um perfil focado para as meninas, porque... muita menina assistia isso. Então, a gente recebeu muito apoio, fomos muito bem recebidas pelos perfis que já existiam. Muitos caras, quando eu fazia alguma pergunta... porque a dinâmica do Luluzinha que vocês conhecem hoje, é completamente diferente do começo. Hoje a gente faz todo o conteúdo pra iniciante, pra quem já é 'sênior' no futebol americano, e traz muita informação. No começo, a dinâmica era diferente, porque eu realmente não entendia algumas coisas, algumas jogadas... então  eu perguntava lá e todo mundo ajudava. Não posso dizer  que enfrentar alguns pensamentos mais retrógrados e machistas foram uma dificuldade, porque isso a gente já esperava, e aconteceu. Mas isso não nos impediu de nada. A gente teve muita sorte nesse quesito, não houve uma grande dificuldade. Muitas vezes, a gente sabe que tem que escrever e o texto que a gente coloca no ar não pode ter um erro. Um post que a gente faz "não podemos" ter um lapso e trocar um nome de jogador que as pessoas cobram mais. Pelo fato de sermos mulheres falando de esporte, sentimos que o holofote fica mais em cima da gente e precisamos acertar sempre, "deus o livre se errarmos alguma coisa". Mas a gente não dá bola pra isso. A gente sabe que faz um trabalho bastante consistente, com bastante dedicação, e erros acontecem, né!? Hater vai ter pra todo mundo, independente do tipo de negócio que vá ter na internet."

5 – Qual a maior satisfação que o NFL Luluzinha lhe traz?

"Nossa, dizer quais as satisfações que o "Luluzinha Club" me traz é muito difícil, porque são várias. Eu tenho muito orgulho do Luluzinha e do que as meninas construíram junto comigo. Eu comento com elas, que desde que a gente abriu o 'Tryout' em 2016 - já faz dois anos - e a gente tem mais meninas no time, que: quem está sozinho pode até ir mais rápido, mas quem está acompanhado vai mais longe. Então, o Luluzinha tem um conteúdo super bacana, um site muito bem organizado, as redes sociais com bastante engajamento. E tudo isso feito 100% por mulheres que amam o esporte. Hoje eu tenho orgulho por conta disso. Mas o mais especial - eu acho - que o Luluzinha me traz, é quando a gente recebe alguma mensagem inbox pelas redes sociais, ou até mesmo pelo whatsapp, dizendo que "ter o Luluzinha melhorou a vida delas. Porque elas gostavam de esportes, mas se sentiam um pouco deslocadas, pois não tinham com quem conversar, e agora tem." Pra você ter uma ideia, a gente tem quatro grupos de whatsapp, com mais ou menos umas trinta e cinco meninas bem ativas em cada um deles. E corre solto o assunto, sabe!? As nossas resenhas, o que a gente acha, e tudo sem muito julgamento. A gente, às vezes, dá uma bola fora também, mas é normal. Então o fato de a gente saber que criamos uma representatividade dentro desse meio, que era bem masculino, nossa... é muito bom! Traz uma felicidade incrível! Porque eu sinto que o Luluzinha está deixando um legado pra outras mulheres. Depois de nós surgiram outros. Teve o "NFL de Meninas", o "NFL de Bolsa"... Mas o fato de a gente ter feito primeiro, ter colocado a nossa bandeirinha lá, e tudo o que parecia que a gente não podia fazer, a gente foi lá e faz bem feito... dá uma felicidade tremenda. Fora que o Luluzinha se tornou uma família, né!? Essas 25 meninas que estão hoje, e as outras que já passaram... nos tornamos amigas. Então, o clima de sororidade e parceria aqui é muito grande. O Luluzinha é uma das coisas mais legais que eu criei. E eu costumo dizer - como eu não tenho filhos -, que o meu legado pro mundo é o que a gente faz no Luluzinha"

6 – Por que assistir NFL?

"Nossa, assistir à NFL é uma alegria. Dentro de um jogo você passa por todos os sentimentos possíveis. Você sente raiva, você sente desespero, você sente alegria... assistir a NFL (futebol americano) é muito legal por preceitos que você pode levar para sua vida. Ele é um jogo de muita estratégia, ele fala sobre domínio de território, um time tem que dominar o território do outro, até o nosso querido touchdown. E o que acontece lá, a estratégia de como esse avanço vai acontecer, ensina para gente muitas coisas, né!? Então eu digo para as pessoas; assistam à 'NFL' porque vocês vão amar! É mais do que um esporte, é um espetáculo. Além de muito bem organizado, de jogos incríveis, viradas sensacionais; é uma coisa que diverte. Principalmente aqui no Brasil, que você está assistindo o jogo, e também está na segunda tela, nas redes sociais, dando risadas com os perfis, brincando... é uma diversão. Vale muito a pena!"

7 - O que esperar desta temporada?

"Essa temporada promete. O final da temporada 2017, mesmo com tantas lesões e perdas importantes em quase todas as franquias, foi sensacional. Acredito que Rams, Jaguars e Vikings vão manter o bom rendimento do ano passado e estou aguardando boas surpresas também no Texans, Raiders e meu 49ers neste ano. Aaron, OBJ, JJ e Watson voltam de lesões, loucos de vontade de jogar. E Patriots vem do vice, sabemos que BB e Brady não gostam de perder, e talvez Big Ben tenha sua última temporada. Acho que será uma 'baaaaaita' temporada."

8 - Quem vai ser o time campeão e surpresa da temporada?

"Eu acho que o campeão será da NFC West. Falei e sai correndo (rsrsrs). Rams eu acho. Ta bem equilibrado esse ano em matéria de times bons. É aquele ciclo de sempre: alguns times se ajustando e outros se desmanchando. Sem contar com o que pode ter de lesão, os segundos anos dos rookies sensação e as mudanças via draft, devemos seguir as boas coisas do final da regular 2017 e playoffs."

"Ah, como supresa, o Griffin no Seahawks. Louca para ver ele jogar!"

9 – Como enxerga o crescimento do interesse do público feminino pela NFL? O que o NFL Luluzinha Club tem a ver com este crescimento?

"Cresce cada vez mais! E vai crescer ainda mais. Representatividade é importante. Ter mulher treinando, cobrindo, narrando é muito bom. Pois aproxima a mulher do esporte ainda mais. Nos dá sensação de pertencimento. Acho que o Luluzinha, como outros sites feitos por garotas, tem muita importância nesse papel. Fico orgulhosa de ter dado o primeiro passo pra isso aqui em terras tupiniquins."

10 - Quando a NFL está na “offseason”, o que a Etienne assiste?

Na offseason eu só como!!! Pois passo 'maratonando' coisas no Netflix e comendo! NFL é a única coisa que acompanho de esporte (rsrs).  Aproveito também para organizar o Luluzinha com as meninas para próxima temporada: gente que sai, gente que entra, ideias novas, etc...

11- Quais as metas para o futuro, onde o NFL Luluzinha ainda pode chegar?

Quero muito ampliar nossos seguidores, que hoje somam mais de 30k orgânicos nas redes sociais e 300mil acessos no site na temporada regular (2017). A meta é dobrar a meta! E também conseguirmos fazer uma coletiva de imprensa na NFL em alguma franquia.  Ano passado foram 13 ou 16 jogos assistidos in loco na NFL. Mas queremos fazer isso da 'sideline' agora.

12 - Você acredita que uma modalidade próxima ao futebol americano, mas jogada por mulheres, possa ganhar força no Brasil? Se sim, ela já existe? Quais perspectivas?

"Futebol americano e flag são modalidades em grande crescimento no Brasil. Neste ano, a seleção feminina de flag ficou em 6º lugar no mundial. As meninas nos homenagearam com manguitos com nossa marca. Foi incrível. A mulherada tem mandado muito bem dentro do campo jogando, sendo Coachs ou da comissão técnica e até mesmo dirigentes. Essa equidade que tem galgado caminho é algo que acredito bastante."

Nota do Redator:

Além de um belo e consistente trabalho, Etienne demonstrou enorme simpatia e humildade. Com foco pela perfeição de alguém que busca melhorar e levar o melhor conteúdo aos fãs do futebol americano no Brasil. O "NFL Luluzinha Club" segue crescendo, e com ele o esporte em nosso país. Apenas vontade não é suficiente, é preciso conhecimento de causa, engajamento e atenção aos detalhes, e isso não falta pra essas meninas. 

Temos muito orgulho em ter conversado com a idealizadora de um projeto tão importante em nosso meio. Não só por ser algo voltado exclusivamente ao futebol americano, esporte que merece ser divulgado em qualquer canto do Mundo, mas sim, por ser algo voltado ao FA e feito 100% por mulheres. Chupa sociedade!  

E assim, em grande estilo, encerramos a nossa querida #SemanaDaNFL. Obrigado a todos! 

Se ainda não conhece o "Luluzinha Club", acesse:
www.luluzinhaclub.com

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